O MUNDO INTEIRO SOU EU
Antes do roteiro, veio o olhar. Uma fotógrafa em Manhattan, atravessada por liberdade e silêncio.
Briarcliff Manor, New York.
2023
Lembrei-me da minha primeira viagem à NYC, em 2014. Cinco dias coincidentes com um feriado no Brasil. Tudo combinado com antecedência com minha melhor amiga: eu partiria de São Paulo, ela de Brasília. Ela morou por lá, conhecia a cidade. Montamos juntas uma programação com cafés, ruas, vitrines e lojas que só quem já viveu em Manhattan sabe indicar. Embarquei. Voo com conexão, como quase sempre é. Cheguei um dia antes. Ela chegaria no seguinte.
Briarcliff Manor, New York.
2023
Mas o voo dela foi cancelado. Depois remarcado. Depois adiado de novo. E, de repente, eu estava sozinha em Manhattan. Por dois dias inteiros. Sem planos. Sem pressa. Sem ninguém para dividir o tempo. Andei pela cidade como quem vagueia por dentro de si. E experimentei um estado raro: a leveza de não precisar justificar minha presença. Nunca me senti tão livre.
Oliver, Briarcliff Manor. NY, 2024.
VISTA DA HIGHLINE, série NYC.
Ano 2024
A liberdade talvez seja uma ilusão. Um rótulo confortável para o que, na verdade, é silêncio, aceitação, autonomia. Mas foi isso que senti — mesmo que eu já fosse adulta há anos, foi naquela deriva que o corpo inteiro entendeu.
Mais tarde, meu irmão e minha cunhada se mudaram para Nova York. Com o primeiro filho, trocaram a ilha por uma cidade do subúrbio. Hoje, quando volto, fico com eles. Brinco com as crianças, ajudo na rotina, cozinho, escuto. Às vezes, pego o trem e passo algumas horas sozinha em Manhattan. É outro tempo. Outro sentido. Mas há algo que não muda: aquela sensação de estar inteira, sem mapa, sem testemunha.
Foi nesse intervalo, entre uma promessa adiada e um passo solto na calçada, que percebi: O mundo inteiro não era Nova York. O mundo inteiro era eu.
Assista:
News from Home (1976), de Chantal Akerman — um retrato da solidão em Nova York, filmado com distância e escuta.
Ouça:
"Empire State of Mind (Part II)" – Alicia Keys